Biombo Escuro

Estreias da Semana

Moonage Daydream

por Guilherme Salomão

17/09/2022; Foto: Divulgação

David Bowie em Imersão lisérgica por sua vida e obra

No ano de 2019, uma votação popular promovida pela BBC Two com o público britânico elegeu David Bowie o maior artista do século XX. Falecido em janeiro de 2016, o camaleão do Rock (alcunha conquistada por sua faceta de mudar sua aparência e estilo ao longo do tempo) consolidou seu status de ícone principalmente a partir de seus trabalhos como cantor, compositor e ator, onde suas experimentações musicais, personalidade disruptiva e imagem intrigante são de legado irretocável para a cultura popular das últimas décadas de nossa história.

Logo em sua abertura, Moonage Daydream, documentário dirigido por Brett Morgen (de Cobain: Montage of Heck), apresenta uma colagem peculiar de imagens e sons que remetem ao espaço, acompanhada por uma reflexão em áudio de Bowie sobre o conceito do tempo e seguida pela combinação de trechos de alguns dos seus sucessos relacionados com o tema. Fica claro, aqui, o convite de Morgen para que embarquemos em uma viagem para os confins de algum outro universo ou realidade de natureza intrínseca. O “Universo Bowie”, por assim dizer.

A partir da observação de que David Bowie foi uma figura cujo a vida e obra afastou-se ao máximo do que pode ser considerado comum, é justo, então, que Moonage Daydream seja um filme que almeja ao máximo afastar-se do convencional. Sendo assim, a partir de uma alternância frenética entre imagens de shows, de entrevistas, de filmes estrelados por Bowie, áudios e até mesmo trabalhos de artes plásticas feitos pelo cantor, Morgen (que lapidou o filme por cerca de 5 anos, a partir do acesso que teve a mais de 5 milhões de imagens de arquivo relacionadas ao artista britânico) nos faz vivenciar uma odisseia pela vida e obra de David Bowie de forma quase que experimental na maior parte da projeção.

Dessa forma, por mais de duas horas, uma imersão sensorial de forma lisérgica e psicodélica é estabelecida como objetivo central da obra. Uma explosão de cores, imagens e sons, combinadas a partir de um trabalho minucioso de edição, deixa explícito elementos como a psique do camaleão do Rock, os mistérios e crenças da sua vida pessoal, como a sua figura era vista e como impactou as pessoas. Indo além, as inspirações, os objetivos que o cantor visava alcançar, sua relação com a arte em si e como a sua obra evoluiu com o passar do tempo, refletindo a época em que estava inserida ao mesmo tempo em que tomava para si as características dessa, são explorados de forma acurada ao longo do filme, sem nunca fazer dessa uma experiência maçante.

É possível, nesse contexto, traçar um paralelo entre Elvis, ótima cinebiografia sobre o Rei do Rock lançada anteriormente em 2022, e Moonage Daydream. Enquanto no primeiro o cineasta australiano Baz Luhrman se utiliza de uma variedade de elementos e possibilidades de linguagem audiovisual, como sequências de montagem dinâmica e remixes musicais, para elaborar um drama que tinha como principal objetivo apresentar um mito por meio de uma abordagem moderna e mais didática para novas gerações (o que não é, de forma alguma, um demérito), em Moonage Daydream, por sua vez, Brett Morgen concebe um documentário que sintetiza o mito de Bowie como ele é. Sem receios, inseguranças ou devaneios criativos em ser instigante e peculiar, tal como a figura central cujo a história nos é contada em tela pelo norte-americano.

Sendo possível afirmar, dessa forma, que a obra da qual estamos diante foi pensada para cativar diretamente os fãs de David Bowie, Morgen é, então, preciso em selecionar imagens que, em momentos chave, deixam seu espectador frente a frente com o cantor, regendo o que é visto em tela por uma playlist de canções bastante objetiva em despertar gatilhos e emocionar os seus fãs. Com isso, muito além do que ser uma viagem lisérgica apenas por ser, ou um experimento vazio, Moonage Daydream, no final, se consolida como uma experiência bastante emotiva e sensível pela mente de uma das personalidades mais icônicas da história. David Bowie é singular. Seu legado vive. Brett Morgen sabe disso.


    Guilherme Salomão

    Redator

    Guilherme Salomão é Social Media, Produtor Audiovisual, Colunista e Criador de Conteúdo digital apaixonado por Cinema, Música e Cultura Pop. Administrador por formação, onde foi autor do TCC “O Poder da Marca no Cinema: O Caso Star Wars de George Lucas”, ele também estudou Produção Audiovisual na Academia Internacional de Cinema.