Biombo Escuro

Estreias da Semana

A Mulher Rei

por Guilherme Salomão

26/09/2022; Foto: Primeiro Plano

O Empoderamento presente na roupagem representativa da cultura africana

Em A Mulher Rei, longa com direção de Gina Prince-Bythewood (The Old Guard) e com roteiro assinado pela própria Prince-Bythewood e Dana Stevens, acompanhamos a história de Nanisca (interpretada pela vencedora do Oscar Viola Davis), uma general líder das Agojie, um exército de mulheres guerreiras do Reino africano de Daomé, que enfrentam o desafio de proteger essa respectiva monarquia de ameaças estrangeiras externas. Com uma equipe de produção formada majoritariamente por mulheres e com um elenco quase que 100% negro (o único indivíduo branco de fato a dar as caras em grande parte da projeção é o personagem Santo Ferreira, um mercador de escravos interpretado por Hero Fiennes Tiffen), A Mulher Rei é um projeto que já nasce com um forte teor de representatividade.

A partir da premissa supracitada, é interessante notar como que apesar dos fatos que presenciamos em tela serem parte de um “universo” bastante específico, de um lugar e época de outrora, eles ainda assim representam algumas das principais dores em relação ao papel e aos desafios enfrentados pelas mulheres na nossa sociedade, que podem ser consideradas universais e latentes até a contemporaneidade. Dito isso, a realidade de A Mulher Rei é, então, a de um mundo predominante de homens e suas regras- Pais que vendem suas filhas para senhores ricos, violência sexual, agressões físicas e a luta intensa em busca de posições de prestígio, e, consequentemente, algumas de suas consequências, por vezes trágicas e dolorosas, são alguns dos exemplos que enfatizam essa perspectiva no longa.

Assim, esses episódios específicos, por sua vez, são apresentados sem muito pudor para os espectadores, de forma mais crua e aberta, um acerto no que tange o impacto direto da audiência pelo que é visto nas mais de duas horas de filme. Salienta-se, também, como que esses acontecimentos, ao serem muito bem decorridos pela ótica de uma cultura africana, uma roupagem pouco explorada em grandes produções hollywoodianas de maior repercussão com audiências globais, fortalecem ainda mais a bandeira da representatividade que permeia A Mulher Rei.

Nesse contexto, apesar de não haver uma inventividade notável para sua composição, é a mise en scéne da direção de Gina Prince-Bythewood que enriquece significativamente a obra. Além do design de produção, figurinos e trilha sonora acurados no que tange a reconstituição estética do reino Daomé como um todo, a direção da estadunidense acerta da mesma forma ao tornar as guerreiras lideradas pela personagem de Viola Davis em figuras vigorosas e imponentes em cena. Nesse quesito, a direção de fotografia, assinada por Polly Morgan, também é destaque. Sobretudo com relação as Agojie, é dado muito valor a beleza daqueles corpos, explorando o reflexo da luz em suas peles suadas e oleosas e os posicionando de forma vistosa em cena.

As sequências de ação propriamente ditas, por sua vez, ainda que não sejam estritamente memoráveis, são encenadas a partir de uma lógica que remete a uma magnitude vista em grandes produções norte-americanas do gênero. Aqui, é justo afirmar que há um clima nas cenas de combate e, principalmente, nas performances do elenco, que nos lembra de forma considerável Pantera Negra (2018), de Ryan Coogler. Porém, com uma roupagem mais realista, dado o escopo da história que é trabalhada. Assim, se há a direção que adota a imponência visual citada anteriormente, um elenco imponente também é destaque em A Mulher Rei, onde é Viola Davis quem se sobressai, com uma atuação que alterna entre momentos de liderança vigorosa com reflexões mais intimistas- Em especial, na subtrama em que seu passado traumático e seu presente se entrelaçam por meio da presença da figura da jovem guerreira Nawi, interpretada por Thuso Mbedu.

É fato que A Mulher Rei, nos seus momentos mais iniciais, pode parecer um longa sem muito ritmo, por tratar não só de um embate direto entre reinos, mas também de histórias mais específicas em paralelo e advindas dessa, como os horrores da escravidão, que acabam sendo mais superficiais em suas abordagens. Ainda assim, a conclusão mais emotiva e romantizada dos fatos faz com que o resultado acabe por pender para uma condensação envolvente de ação, romance, autodescoberta e autoperdão, envoltos por camadas de empoderamento e representatividade relevantes.


    Guilherme Salomão

    Redator

    Guilherme Salomão é Social Media, Produtor Audiovisual, Colunista e Criador de Conteúdo digital apaixonado por Cinema, Música e Cultura Pop. Administrador por formação, onde foi autor do TCC “O Poder da Marca no Cinema: O Caso Star Wars de George Lucas”, ele também estudou Produção Audiovisual na Academia Internacional de Cinema.