Biombo Escuro

estreias da semana

trem-bala

por Guilherme Salomão

03/08/2022; Foto: Primeiro Plano

A Irônica e Estilizada reflexão sobre o Destino

Brad Pitt parece determinado a explorar e desenvolver, de uma vez por todas, o seu timing cômico. É justo, a partir de uma análise mais direta de sua trajetória até agora, que um dos maiores astros de Hollywood se sinta livre para se dedicar aos projetos que bem entender, sobretudo após acumular um número considerável de sucessos comerciais e trazer consigo um Oscar na bagagem, conquistado por seu papel coadjuvante de destaque em Era uma vez em... Hollywood (2019), de Quentin Tarantino.

Após A Cidade Perdida, comédia lançada previamente em 2022, o ator emplaca agora o seu segundo trabalho do gênero em sequência. Agora, a aventura trivial de caça ao tesouro vem dar lugar a um Trem-Bala no Japão que se torna palco para incontáveis situações em que a comédia e a ação se combinam em absurdidade, quando diversos indivíduos, incluindo um agente secreto azarado (Pitt) e uma dupla de irmãos assassinos (Aaron Taylor-Johnson e Brian Tyree Henry), embarcam com um objetivo final conectado por meio de uma armação de uma vingativa figura mafiosa (Michael Shannon).

Por meio de um olhar mais generalista e abrangente, é interessante notar como a estrutura do longa se assemelha as icônicas comédias do trio Zucker, Abrahams & Zucker. Assim como em Apertem os Cintos... o Piloto Sumiu (1980), por exemplo, o desenrolar da ação acontece majoritariamente em um único espaço, onde, paralelamente, são apresentados um determinado número de tramas que, como supracitado, se conectam em algum momento da história. Indo mais além, essa é uma lógica que também se assemelha as mais bem-sucedidas obras sobre o detetive fictício Hercule Poirot, da escritora britânica Agatha Christie.

A grande questão aqui em específico é que o elemento Trem Expresso em si não se manifesta para a construção de uma tensão demasiada na trama, onde há um potencial em transformá-lo em um dispositivo que traga certa urgência às situações, que parece desperdiçado. Em sua maioria por meio de flashbacks, são apresentados, no lugar disso, desvios narrativos consideráveis do foco central apresentado de início, que apesar de causarem esse “desfoque” em determinados momentos, dado os propósitos finais do longa, tornam-se justificáveis a partir da ótica de estabelecer o plano de fundo das tramas paralelas e suas futuras conexões.

O que de fato se sobressai nessas sequências, porém, assim como em grande parte de Trem-Bala, são determinadas decisões criativas estabelecidas pela direção de David Leitch (Atômica, Deadpool 2). Prezando sempre pelo absurdo por essência, o envolvimento do público é sustentado pela condensação inteligente do humor e de elementos de linguagem típicos da cultura cinematográfica do Japão. Especialmente os letreiros de tipografia estilizada, que remetem aos tradicionais animes nipônicos, a violência à la Tarantino, desmedida e bastante gráfica, aludindo a filmes de artes marciais, e uma atmosfera Neo-noir estabelecida essencialmente por meio da fotografia rica em luzes de neon.

No final, porém, o absurdo toma outros contornos. As construções paralelas e reviravoltas citadas anteriormente, que de início soavam desfocadas, se unem para demonstrar que todas as ações terão uma consequência, e tudo acontece por uma razão ou por ordem do destino, tanto na trama do longa quanto na realidade. Trazendo, dessa forma, uma reflexão consideravelmente corriqueira em seu clímax, sobre o conceito de destino em si, o Trem-Bala que viaja em alta velocidade de Tóquio a Morioka torna-se, então, um elemento metafórico para tal. Afinal, assim como tudo e todos, em teoria ele também possui um destino certo desde o princípio.

Pode soar sem sentido, por destoar do restante do filme, que, primordialmente, não demonstrava uma intenção de se levar genuinamente a sério. Por outro lado, também é possível de ser interpretado apenas como uma piada irônica. É inegável, de qualquer forma, que a estilização e o bom-humor fazem dessa uma jornada lúdica repleta de bons momentos.


    Guilherme Salomão

    Redator

    Guilherme Salomão é Social Media, Produtor Audiovisual, Colunista e Criador de Conteúdo digital apaixonado por Cinema, Música e Cultura Pop. Administrador por formação, onde foi autor do TCC “O Poder da Marca no Cinema: O Caso Star Wars de George Lucas”, ele também estudou Produção Audiovisual na Academia Internacional de Cinema.